quarta-feira, 25 de junho de 2025

CRISE DE SENTIDOS

ENTRE A FLOR E O NOTEBOOK

                                                             Por Antonio Evangelista

A imagem da flor branca ao lado do notebook evoca duas forças aparentemente opostas: o ser que apenas é e o fazer que exige sentido. A flor desabrocha sem perguntas; o notebook só ganha valor quando preenchido de ideias. E entre esses dois polos, está o ser humano: projetando significado em tudo, buscando justificar sua existência.

Essa busca por sentido é central na experiência humana, e a sua ausência pode gerar um vazio existencial. A Terapia Cognitivo-Comportamental reconhece isso ao abordar os pensamentos automáticos negativos que surgem em momentos de perda de propósito. Questionamentos como “por que continuo?”, “o que isso tudo significa?”, “tem alguma utilidade?” revelam uma angústia legítima, não patológica em si, mas que pode se tornar adoecedora se não acolhida.

“Quando a vida nos apresenta flores e máquinas, talvez o que ela peça não seja escolha, mas escuta.”

SENTIDO E RESSIGNIFICAÇÃO

A TCC propõe que o sofrimento psicológico está frequentemente ligado a interpretações distorcidas da realidade. Em contextos de crise de sentido, essas distorções podem incluir:

  • Generalizações negativas (“nada mais vale a pena”)
  • Catastrofizações existenciais (“se nada tem sentido, então tudo está perdido”)
  • Perda de perspectiva temporal (“vai ser sempre assim”)

O processo terapêutico busca ressignificar — não com respostas prontas, mas com perguntas guiadas, que favoreçam o redirecionamento do olhar. E, curiosamente, é isso que sua imagem propõe: a flor e o notebook não dizem nada, mas sugerem tudo.

VIKTOR FRANKL E A LOGOTERAPIA

Uma grande referência aqui seria Viktor Frankl, psiquiatra e sobrevivente de campos de concentração, que desenvolveu a logoterapia — terapia centrada na busca de sentido. Para Frankl:

“O ser humano não está destruído pelo sofrimento, mas pela perda do sentido no sofrimento.”

Sua reflexão dialoga fortemente com isso: a dor da falta de sentido não se resolve apenas com respostas racionais, mas com a disposição para ouvir o silêncio da flor e o vazio da tela.

A FLOR COMO METÁFORA DO SENTIDO SILENCIOSO

A flor não precisa justificar sua existência. Ela floresce, silenciosa e inteira, sem necessidade de provar sua utilidade. Talvez o sentido da vida não esteja apenas no que fazemos, mas no modo como estamos no mundo. O notebook, ao seu lado, exige conteúdo, ideias, produtividade; a flor, por sua vez, oferece presença. Enquanto um pede respostas, a outra convida à escuta. E se o sentido não for algo a ser conquistado, mas algo a ser reconhecido?

A ausência de sentido não é apenas um dilema filosófico — é uma dor concreta. Quando perdemos o “para quê” das nossas ações, instalam-se sintomas que vão além da tristeza: a desmotivação, a apatia, a desconexão consigo e com os outros. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) reconhece essa dor como legítima e propõe caminhos de ressignificação. Ela nos ensina que certos pensamentos automáticos — como “nada mais vale a pena” ou “vai ser sempre assim” — podem nos aprisionar em narrativas de desesperança.

Mas talvez, quando a vida nos apresenta flores e máquinas, ela não esteja exigindo uma escolha entre uma ou outra, e sim nos pedindo algo mais sutil: escuta. Uma escuta que não busca resolver, mas acolher. Nem tudo precisa ser entendido de imediato — algumas coisas precisam apenas ser sentidas, vividas, respeitadas em seu silêncio.

2 comentários:

  1. Essa imagem da flor com o notebook me fez refletir demais... Ela mostra bem esse contraste entre só ser e a pressão de fazer o tempo todo. O texto tocou muito, principalmente na parte sobre escutar o outro, a si mesmo, e até o silêncio.

    A forma como você trouxe a TCC e a logoterapia deixou tudo ainda mais claro. A gente esquece que o sentido da vida nem sempre está nas respostas, mas na forma como a gente escolhe olhar. Às vezes, só estar presente já é o bastante, como a flor que existe, impacta, e nem precisa se explicar.

    Obrigada por compartilhar algo tão profundo. Que mais pessoas se sintam tocadas como eu fui.

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    1. Kamilla, suas palavras me emocionaram profundamente. Ontem, antes mesmo de escrever o texto, tirei aquela foto — e algo nela já me fez parar, respirar e apenas sentir. Fico muito feliz que tenha tocado você também.
      É bonito pensar nesse contraste que você trouxe: o ser versus o fazer, o silêncio que fala, e a flor que apenas existe, mas impacta. Saber que a TCC e a logoterapia ajudaram a clarear essas ideias só reforça pra mim que esse encontro de pensamentos valeu a pena.
      Muito obrigado por compartilhar sua reflexão com tanta sensibilidade. Que esse sentimento de presença e significado continue se espalhando, assim como essa troca linda que tivemos aqui.

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Ola deixe seu comentário e se precisar de mais informações ou ajuda com alguns dos temas entre em contato: psi.antonioevangelista@gmail.com

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